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Uma alimentação consciente no paraíso da comilança

A propaganda da obesidade

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Por Juliana Carreiro
Atualização:

Recentemente fui a uma palestra do Instituto Alana, uma Organização Não Governamental que tem como principal objetivo "mobilizar a sociedade para os temas da infância". Entre estes temas estão o combate ao consumismo e às campanhas publicitárias abusivas voltadas para os pequenos. Diferentemente do que vemos todos os dias nos canais de TV abertos ou fechados e nos supermercados de todo País, há uma série de leis que regulamentam a propaganda de produtos alimentícios para este público, porém, elas não são cumpridas.

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A Resolução 163 de 2014 do Conanda, Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, proíbe a publicidade infantil, os Artigos 36 e 37 do Código de Defesa do Consumidor proíbem a propaganda abusiva e o Art 227 da Constituição Federal e os Artigos 6 e 17 do Estatuto da Criança e do Adolescente também tratam deste assunto. Qualquer um pode denunciar uma propaganda que considere abusiva. Para isso é preciso entrar em contato com órgãos como o Procon ou a Defensoria Pública, por exemplo. O Alana também recebe algumas denúncias e dão encaminhamento a elas. Porém, o termo "propaganda abusiva" é muito subjetivo e talvez por isso as leis sejam tão desrespeitadas. Na minha opinião, uma campanha que utiliza um personagem familiar das crianças como "porta voz" de um produto nocivo para a saúde delas já é uma propaganda abusiva. E, infelizmente, vemos muitas destas por aí.

Vou reunir aqui alguns dados que ouvi durante a palestra e que me levaram a um outro assunto, a obesidade infantil. As crianças brasileiras passam em média 5 horas por dia em frente à televisão, os intervalos comerciais de seus programas preferidos são recheados de propagandas de alimentos. Dois terços dos produtos anunciados são ultraprocessados (bolachas recheadas, salgadinhos, refrigerantes e chocolates, entre tantos outros). Bastam trinta segundos para uma criança aprender o nome de uma marca. Por conta de todos estes dados é que as leis contrárias a este tipo de publicidade são necessárias. Elas se baseiam na vulnerabilidade deste público, que não consegue diferenciar o entretenimento de uma indução ao consumo, e tampouco sabe se o que está sendo anunciado é bom ou ruim para a sua saúde. E os anúncios geralmente são voltados para eles, porque atualmente costumam conseguir tudo o que querem dos pais.

O excesso de tempo diante da TV, além de representar uma grande exposição ao que é anunciado, também é um sinal claro de sedentarismo. O conjunto destes fatores, aliado ao baixo consumo de frutas, hortaliças, leguminosas e cereais e o excesso de ultraprocessados, que costumam ser a base da alimentação, podem estar colaborando com o aumento dos índices de obesidade infantil em nosso País. Diferentemente do que se pensa o excesso de peso não é simplesmente fruto da equação "consumir mais do que gastar". É a consequência de um processo inflamatório como tantos outros: rinite, sinusite, amidalite... Também é pouco divulgado que uma criança obesa costuma sofrer de carências nutricionais. Elas é que causam esse processo. Essa carência vem do baixo consumo de alimentos naturais. A melhor forma de se prevenir a obesidade infantil é tomar cuidado com o que a mãe vai consumir ao longo da gestação e o que dará para os filhos até o segundo ano de vida deles. Falei detalhadamente sobre isso no post sobre o Programa dos Mil Dias, da Organização Mundial da Saúde. Essa fase é determinante para se prevenir doenças para o resto da vida.

E não é apenas uma questão estética. O excesso de gordura que gera a obesidade também pode causar outros processos inflamatórios no organismo. Dependendo da predisposição genética, as crianças poderão apresentar outros problemas como o aumento dos índices de colesterol e triglicérides, o aparecimento do diabete tipo 2, o aumento de pressão arterial e até mudanças hormonais, como a menarca precoce, que faz com que as meninas parem de crescer mais cedo. Mas não é só a saúde física que é prejudicada. Aqueles que estão fora do padrão aceito pela nossa sociedade costumam sofrer discriminação, o que pode ser muito prejudicial para a autoestima deles. É importante ressaltar que o excesso de peso não é a única consequência nociva de uma má alimentação na infância. A criança pode não ter propensão ao acúmulo de gordura, mas se sua rotina alimentar for pobre em nutrientes e rica em açúcar, sal e gordura, ela certamente desenvolverá outros problemas de saúde, a curto ou a médio prazo.

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Para finalizar, se neste período adquirirmos hábitos saudáveis, teremos muito mais chances de manter esta boa relação com a comida durante a vida toda. É muito simples, basta você pensar em mudar algum hábito alimentar consolidado há muitos anos. Fica difícil não é? Mas se eles forem a sua única referência, você não terá problemas no futuro. Vou dar um exemplo simples. Na minha casa nunca teve refrigerante e fomos acostumados a não beber nenhum tipo de líquido durantes as refeições. Este costume positivo me acompanha até hoje e já estou fazendo o mesmo com o meu filho, não sinto nenhuma falta de um ou de outro. A tendência é que uma criança que se alimenta mal costuma ser um jovem que se alimenta mal e isso se repetirá na fase adulta. Dados recentes do Ministério da Saúde apontam que um em cada cinco brasileiros consome doces em excesso, cinco ou mais vezes na semana, 28,5% dos jovens têm este costume, 30% deles também costuma beber refrigerante todo os dias. Nunca é tarde para melhorar os hábitos alimentares, mas quanto antes isso acontecer, melhor.

 

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