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Porque somos todos iguais na diferença

Para aumentar a família, casal homoafetivo opta por gravidez e adoção

Por Claudia Pereira
Atualização:

À espera de Teo, Raphaela e Fernanda contam como enfrentam e superam os preconceitos

Raphaela, 28 anos, descobriu que gostava de garotas aos 14. Os pais, desconfiados, questionaram e ela confirmou, sem medo, sem tropeços. Até porque não haveria como negar, já que a mãe da jovem com quem ela estava saindo decidiu ligar para a sua contando tudo. "Lembro que foi bem difícil para meus pais ouvirem que eu era lésbica. Nunca me rejeitaram, mas sinto que, até hoje, é difícil para eles aceitarem. Porém, sempre me apoiaram e me deram suporte para eu fazer tudo o que queria", comenta. Até entrar em um relacionamento sério, não exigia deles um posicionamento. Mas depois de conhecer Fernanda, sua companheira há quatro anos, já não dava mais para "fingir" que nada acontecia. Quando decidiram se casar, Rapha anunciou aos pais, mas eles não compareceram à cerimônia. "Eles sempre se preocuparam com o que as outras pessoas pensariam". Na opinião de Raphaela, este é um conflito que sempre existe dentro das famílias, mas ela, já na adolescência, conseguiu de alguma forma romper com essa busca pela aprovação alheia. "Já faz alguns anos que superei a expectativa de querer aprovação. De qualquer forma, nunca tive problemas em me assumir".

Dia do casamento de Rapha e Nanda. Foto: Lela Beltrão

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Já Fernanda, de 33 anos, teve seu primeiro relacionamento com uma garota aos 18. Contou para a mãe, que não aceitou. "Quando comecei a me descobrir, compreender e aceitar que gostava de garotas pensei que era a única lésbica da minha cidade. Eu não conhecia ninguém, achava que as pessoas iriam olhar para mim e saber. Não tinha o menor conhecimento e isso foi muito ruim", comenta Nanda. Ela cresceu em uma cidade do interior de São Paulo e lembra que este foi um momento muito difícil, que procurou pelo apoio de alguém, mas este apoio não veio de lado algum. Depois da pressão da família, principalmente da mãe, decidiu que tentaria se relacionar com um homem. Foram cinco anos em que se viu aprisionada em uma vida guiada por outras pessoas, menos por ela. Após muito tempo de namoro, Nanda e seu parceiro chegaram ao matrimônio, que durou apenas quatro meses. Decidiu, então, criar coragem para seguir seus sentimentos, seus anseios e, entre ter uma vida plena e fazer feliz sua família, escolheu a própria felicidade. Aos 24 anos, rompeu seus laços familiares para ir, pela primeira vez na vida, em busca do que realmente queria. A história de Nanda e Rapha é como a de muitos outros casais. As duas trabalhavam na mesma empresa, porém em prédios diferentes. Uma amiga em comum vivia dizendo que elas precisavam se conhecer, já que trabalhavam na mesma área e tinham muitas afinidades. Nenhuma das duas deu muito crédito aos apelos da "amiga cupido". Mas para aqueles que acreditam, o destino é mesmo infalível. Houve uma fusão dos prédios e as duas acabaram se cruzando, confirmando o que a amiga já sabia há tempos. Nascia, naquele momento, um relacionamento duradouro.

Intolerância

Atuantes em movimentos LGBT, ambas relatam as dificuldades enfrentadas em suas jornadas. Já passaram por várias agressões, tanto por serem mulheres quanto lésbicas. As duas apontam preconceitos sofridos em ambientes de trabalho, "muitos processos seletivos questionam seu estado civil e, em caso positivo, logo se pressupõe uma heterossexualidade", diz Raphaela, e completa, "quando você chega ao ambiente de trabalho logo sente os olhares, os gestos". As agressões vão desde pessoas apontarem para as duas na rua por estarem com as mãos dadas ou fazerem comentários indignados por serem um casal, até terem sido abordadas por um homem que, do flerte, passou para a agressividade diante ao enfrentamento das duas. Para Rapha e Nanda, a intolerância vem aliada a uma série de fatores, sendo um deles a não inserção de temas que envolvam gêneros nos planos de educação e que poderiam auxiliar as pessoas a lidar com a diversidade. Mesmo com alguns processos legislativos em andamento, as duas não encontram muita linearidade nas políticas públicas para homoafetivos. "É preciso estimular pessoas que não estão inseridas nos movimentos a ingressarem neste diálogo", diz Raphaela.

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À espera de Teo

Desde que decidiram ter uma vida juntas, Raphaela e Fernanda começaram a planejar um futuro, e isso incluía um filho. Depois de terem passado uma temporada nos Estados Unidos e Rapha ter ingressado em um mestrado quando retornou ao Brasil, definiram que era chegada a hora do projeto maternidade. Assim, deram entrada ao processo de adoção ao mesmo tempo em que iniciaram o tratamento clínico para que Nanda engravidasse. Um ano e cinco tentativas de inseminação artificial e fertilização in vitro depois, ela engravidou e, um dia após a notícia do positivo, elas participaram da primeira etapa do processo para adotar uma criança. Como o objetivo das duas é ter dois filhos, deram continuidade aos trâmites para a adoção. "Neste caso, a lei é igual para casais heterossexuais e homoafetivos, não tivemos nenhum problema e sentimos que o andamento é igual", explica Nanda. Segundo elas, por estarem grávidas o processo de adoção ficará suspenso por dois anos. Depois desse período, se desejarem, poderão retomar do ponto em que pararam. No chá de bebê de Teo, uma conquista para Raphaela, seus pais decidiram participar do evento. Já a mãe de Nanda, desde que ela conheceu Rapha, passou a aceitar o relacionamento das duas e, além de apoiá-las, é bem presente em suas vidas.

Rapha e Nanda esperam por Teo, seu primeiro filho. Foto: Gabi Trevisan

Até a edição final desta matéria, Teo, que virá ao mundo em um parto humanizado*, poderia nascer a qualquer momento.

*parto humanizado é quando as decisões da gestante são levadas em consideração, havendo o mínimo de intervenção médica e deixando a natureza seguir seu curso, desde que haja segurança para mãe e para o bebê.

Pautas e sugestões podem ser encaminhadas para o e-mail familiaplural@estadao.com.

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