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Males crônicos - crônicas sobre neuroses contemporâneas

Opinião|A nação ressentida

Começou a Copa e o que mais ouço e leio é: “esquerda”, “direita”, “coxinha”, “petralha”. Quem, afinal, está em campo?

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Atualização:

» Começou a Copa e o que mais ouço falar não é "Neymar", "Oscar", "Marcelo", "Felipão".

O que mais ouço e leio é: "esquerda", "direita", "coxinha", "petralha".

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Quem, afinal, está em campo?

Nunca fui grande fã de futebol - casa de ferreiro, espeto de pau - e isso nunca incomodou ninguém, muito menos a mim. Na quinta-feira mesmo eu perguntava aos amigos: mas a que horas vai ser o jogo? É hoje? Riam de mim: inocente.

Até aí, nada. Claro que quis ver a abertura da Copa no meu país e, vendo, torci. Mas nunca fui grande fã de futebol, repito, e, se me fosse dado voto, eu votaria contra a realização da Copa no Brasil, por simples matemática de custos e benefícios considerando todas as promessas não cumpridas, a começar pelo não uso de recursos públicos nos estádios.

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Os jogos são bons, mas, depois de 90 minutos, acabam.

Nunca fui grande fã de futebol e não me entusiasmo tanto com esta Copa. Até aí, ok também. Eu me entusiasmo com coisas ridículas, como capas de livros e avistamentos de alienígenas, então não pretendo ter moral para colocar minhas paixões acima das alheias.

O problema é que isso me tornou tucano, nos últimos dias. Não saber horário de jogo é tucanagem, não querer botar dinheiro em ingresso é tucanagem, querer que a Copa vá pra Austrália é tucanagem.

Preferir cinema a futebol é "complexo de vira-lata". Como se o futebol definisse quem sou ou somos.

E meus amigos loucos por futebol? Todos tornaram-se petistas. Querer vestir a família inteira com a bonita camisa da Seleção é petismo, pendurar bandeiras é petismo, gritar como louco na rua é petismo.

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Este é o pior jogo de todos. O Fla-Flu partidário, ignorante e mesquinho, que não deixa quem gosta de futebol curtir o seu futebol e não deixa quem não gosta de futebol curtir o seu filminho. Viramos uma nação de mutleys e rabugentos que reclamam quando faz sol, reclamam quando faz frio, reclamam quando não faz nem sol nem frio.

E torcem, o tempo todo, para que os outros quebrem a cara. Uma nação ressentida e autossabotadora. A pátria do coito interrompido.

A nação do "eu avisei que ia dar merda".

Mas e se não der?

Precisamos ter um plano B. Não para o caso de dar tudo errado, mas para o caso de dar tudo certo.

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Opinião por Renato Essenfelder

Escritor e professor universitário, com um pé no Brasil e outro em Portugal. Doutor em Ciências da Comunicação pela USP e autor de Febre (2013), As Moiras (2014) e Ninguém Mais Diz Adeus (2020). Docente e pesquisador nas áreas de storytelling e escrita criativa, escreve crônicas de cultura e comportamento no Estadão desde 2013.

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