Ser negro, gay, muçulmano, ou pertencer a qualquer grupo que sofra discriminação, não dá a ninguém o direito de ser preconceituoso. Deveria ser, em vez disso, uma lição de como combater o preconceito, não de como alimentá-lo.
Temos um exemplo recente circulando pela internet. Há poucos dias, um jovem negro foi ao Facebook protestar contra as cotas raciais nas universidades com o seguinte discurso: "Se é assim, vamos fazer cota para gostosa, porque existe na sociedade o preconceito de que toda gostosa é burra". Amigo: não vamos. Mas se fôssemos, queria ver em qual cota você enquadraria a Beyoncé, ou a Michelle Obama.
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Não vamos por um motivo simples: até onde se sabe, gostosas são "apenas" discriminadas, mas nunca foram escravizadas. A não ser as negras que, essas sim, têm direito à cota não por serem gostosas, e sim por serem negras. O Brasil carece primeiro de uma cota para pessoas que falam besteira nas redes sociais. O mundo está cheio delas. É muito mais urgente.
Adotar políticas afirmativas como as cotas não significa subestimar alguém pela cor da pele. Ninguém é "verme, ou parasita do Estado", como disse o rapaz, por ser cotista. São meios de compensar os quase 300 anos de retrocesso social que o País sofreu ao atravessar o período escravocrata de sua história. Negro virou gente não faz muito tempo: 1888. Ele só teve 127 anos para galgar o que o branco, inclusive a gostosa, galgou desde pelo menos 1500. O ataque a essas medidas do poder público afeta também todo o contexto que as sustentam. Quem ataca nega a escravidão. E quem nega a escravidão, pelo menos para mim, é o racista da história.
"Eu sou pobre, sou negro, vim da periferia, estudei minha vida toda em escola pública. E mesmo assim passei sem cotas na universidade federal de São Paulo", disse o jovem, dando o exemplo de que o País não precisa de cotas. Amigo: parabéns! Mas o País não é você.
Todo mundo conhece a qualidade do ensino público no País. O governador Geraldo Alckmin, por exemplo, parece considerar péssimo. Veja a resposta dele ao ser questionado por um internauta se colocaria os filhos ou netos em escola pública, em entrevista dada ao Estadão:
"Eu fiz ginásio em escola pública. Fiz o científico em escola pública. Não tenho mais filho em idade escolar. Mas o que ele quer saber é: a escola pública precisa melhorar de qualidade. Eu estou de acordo", afirmou Alckmin. Mas repórter insistiu: "A pergunta, governador, é se o senhor colocaria seu filho em escola pública. Tipo em Capão Redondo". A resposta: "Olha, nós vamos trabalhar para melhorar a escola pública."
Alunos de escola pública viram notícia quando são aprovados em grandes universidades. Banalidades não costumam parar nos jornais. Só o que surpreende.
O que esse jovem tem feito é criticar as cotas pelo ódio, através de uma argumentação rasteira e sem sustentação. Não é assim que que se combate o racismo. Assim você é racista e só piora toda a situação.