A ressaca é disso, creio. Da intolerância, de não poder debatercom uma pessoa pensando silenciosamente "não vou perder meu tempo". De ouvir coisas preconceituosas de vários lados todos os dias e, mesmo sem se acostumar, se acostumar. Ressaca de gente brigando na PUC, de muro separando amarelo de vermelho, de famílias rompendo enquanto os outros estão lá, gritando no microfone, "em nome do sobrinho João". A ressaca é também da falta de outro assunto, de todo mundo nervoso, de um julgando o caráter do outro sem olhar para si mesmo. Ressaca dos gritos na janela, do nosso reality show moderno com todos esses personagens. Dos barracos, da falta de respeito. Deus -- que foi tão mencionado ontem -- deve estar com uma baita ressaca da ignorância que assola os homens por aqui.
A ressaca dos mesmos comentários, dos mesmos comentaristas, dos mesmos textos e subtextos. Tudo "pregando para convertido". Todo mundo fugindo do debate, se embriagando em curiosidades mórbidas, em manifestações violentas nas redes sociais. Ressaca de gente que, do dia para a noite começou a falar de política, enchendo a boca para dizer que é politizado mas não pensa o que é ter uma postura política na vida. Gente que destrata as pessoas ao seu redor ou não espera na fila da vacina.
Ressaca das mulheres que são assediadas todos os dias no metrô e de brigas de torcidas organizadas de futebol -- que carregam tacos e armas e para se matarem. Somos um país violento. E violência causa medo, indignação e desesperança. Então, alguém tem algum Engov sobrando aí?
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