Exposição mostra 'quartos dos sonhos' de arquitetos italianos

Em cartaz na Trienal de Milão, mostra a cargo de Beppe Finessi apresenta propostas de ambientes nada convencionais

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Por Marcelo Lima
Atualização:
Anéis concentricos na instalação de Francesco Librizzi Foto: Divulgação

Ao longo de toda a história, a arquitetura de interiores tem se revelado um campo de treinamento fértil para arquitetos e designers. Muitas vezes são para as casas – e para seus proprietários – que móveis e objetos são imaginados para, só depois, serem fabricados de forma seriada. “O projeto de interiores precede o de design”, afirma o pesquisador e crítico Beppe Finessi, que, a convite do Salão do Móvel de Milão, assina a curadoria de Stanze. Altre filosofie dell’abitare (Quartos. Outras filosofias do habitar), mostra em cartaz na Fundação Trienal de Milão até 12 de setembro. “Meu ponto de partida foi imaginar o quarto como um palco da vida. Da vida de hoje e da de amanhã”, afirma Finessi, que confiou a 11 escritórios a tarefa de traduzir, na forma de instalações, suas reflexões sobre o tema. Entre eles, jovens e mestres. Personalidades em evidência, ou não, da cena italiana. Assim, após uma breve introdução histórica, para colocar o visitante em contato com interiores assinados por grandes nomes da arquitetura, tem início a apresentação dos quartos, propriamente ditos, que receberam a assinatura de Andrea Anastasio, Manolo De Giorgi, Duilio Forte, Marta Laudani e Marco Romanelli, Lazzarini & Pickering, Francesco Librizzi, Alessandro Mendini, Fabio Novembre, Carlo Ratti, Umberto Riva e Elisabetta Terragni. Ao contrário de outras mostras do gênero, no entanto, inexiste em Stanze a obrigação de contextualizar um ambiente. A abordagem mais ou menos realista de cada espaço ficou a total critério dos participantes. Mais do que simular um ambiente ou apresentar produtos, prevalece entre eles a intenção de vincular ideias e levantar questões.  No espaço criado por Andrea Anastasio, por exemplo, o quarto é apresentado como um lugar onde se torna possível afirmar, ou negar, a dimensão individual. O projeto parte da identificação de um conjunto de móveis essenciais ao desempenho da vida diária, que surgem seccionados por uma cortina semitransparente. Debater outra dualidade, no caso entre mostrar e ocultar, foi a intenção da dupla Marta Laudani e Marco Romanelli. “A casa já foi conceituada como máquina de habitar. Não que não o seja. Mas ela é também o teatro de nossas vidas diárias e é sob esse ponto de vista que situamos o projeto”, conta Marta.  “Famílias são compostas de indivíduos que se tornam adultos que, muitas vezes, acabam vivendo com seus pais e passam a sentir necessidade de delimitar seus espaços, de criar sua própria intimidade, sua própria história”, afirma Romanelli, que lançou mão de uma pesada cortina para delimitar uma espécie de tenda no centro do ambiente. Ursus, de Duilio Forte, parte de uma perspectiva completamente oposta. Foi criado para dar ao visitante a oportunidade de experimentar a vida a partir de uma visão zoomórfica. O urso, animal associado com o Hemisfério Norte, onde vive em meio a espaços monumentais, na floresta ou no gelo, inspirou o arquiteto. 

Logo à entrada, a cabeça abriga uma sauna. Purificação da mente e do corpo para introduzir a sala principal, ou corpo. O ambiente central, com pé-direito duplo, é o espaço de convívio. Uma mesa central longa, delimita a cozinha. O interior é habitado por objetos diversos, esculturas, livros e imagens relacionadas com o mundo escandinavo, mitologia, viagens. A relação entre dentro e fora surge no centro de duas outras propostas. Em D1, de Francesco Librizzi, o desenho do quarto relata a descoberta do espaço interno e o papel da arquitetura na mediação entre casa e paisagem. Em um espaço elíptico formado por anéis concêntricos, o espectador vê crescer gradualmente o limite entre interior e exterior.  Já na proposta de Fabio Novembre, a discussão se desloca para a dimensão simbólica do ambiente. “Vejo o ovo como um útero solidificado. Talvez por isso sua forma sempre fascinou a humanidade. Não me surpreende que com todo esse potencial vital ele tenha sido associado à ideia de perfeição”, comenta o arquiteto, que resolveu celebrar a icônica forma na construção de seu quarto. “Minha ideia foi dedicar um espaço ao sonho. Uma concha esférica revestida externamente por espelhos e internamente por couro. Recebido por duas vestais douradas, o visitante é literalmente engolido pela sensação de cor e calor, mergulhando dentro de si mesmo, observando-se a partir de dentro”, conta Novembre. “Não podemos nos esquecer de que o sono nos leva de volta, todas as noites, para o mergulho amniótico original. Mas, todos os dias, temos de nascer de novo.”

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