Uma casa onde o morador decide o que fica dentro (ou fora)

Inspirada em projeto conceitual, casa construída em Bauru, pelo escritório FGMF, traz cobertura e pérgolas deslizantes

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Por Marcelo Lima
Atualização:

Em 2009, a revista britânica Wallpaper elencou o escritório paulistano FGMF, dos arquitetos Fernando Forte, Lourenço Gimenes e Rodrigo Marcondes Ferraz, em seu Architects Directory: uma edição especial que elenca, a cada ano, os 30 escritórios de arquitetura considerados pela publicação como os mais promissores do mundo.

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Para constar no diretório, que pela primeira vez incluía um escritório brasileiro, o trio elaborou, a pedido, um projeto conceitual batizado de Casa Tic Tac, uma residência unifamiliar na qual paredes dotadas de trilhos permitiriam a seus moradores recriar permanentemente a planta do imóvel.

Capa da edição 251 de nosso suplemento, o projeto encantou um leitor residente na cidade de Bauru, interior de São Paulo, que não hesitou em contatar o FGMF movido pelo desejo de morar em uma casa nos moldes da apresentada pela reportagem. E ele conseguiu.

“Desde nosso primeiro encontro, ficou claro que ele gostaria de algo no espírito, mas não de construir uma réplica da Tic-Tac”, conta Gimenes. “A mulher dele disse até aceitar paredes móveis, mas a casa deveria ser ‘normal’ e não ultrapassar 200 m²”, completa Forte.

Com esses condicionantes em mente, a equipe foi visitar o terreno, em um condomínio. “Era uma área no limite do empreendimento, sem grandes vistas a privilegiar. Optamos, então, por criar uma casa-pátio, voltada para dentro e na qual, no lugar das paredes, seria a cobertura que se movimentaria”, diz. 

“Percebemos que, enfatizando as transparências com painéis de vidro abertos para uma sequência de pequenos pátios, poderíamos sugerir uma área construída ampliada, diminuindo a sensação de confinamento. Além disso, a construção ficaria mais orgânica, apesar do traçado ortogonal”, explica Gimenes.

Outra consequência é que, uma vez finalizada, a obra não contaria com fachadas definidas, com exceção da frontal. Não haveria, por exemplo, um jardim da frente ou dos fundos. Áreas externas seriam tratadas como as internas e, por fim, não existiria uma hierarquia espacial.

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“Existe nesse projeto uma investigação sobre a casa enquanto objeto construído: não se trata simplesmente de um abrir e fechar de portas. Aqui o morador pode transgredir essa regra, vivendo em ambientes intermediários”, resume Forte, diante da obra, recém-construída, passados pouco mais de dois anos desde o primeiro encontro com o casal de proprietários.

Com fechamento realizado por meio de paredes de concreto aparente intercaladas com grandes áreas envidraçadas – e tendo sua cobertura deslizante como grande trunfo –, a casa Tic Tac de Bauru é bastante eficiente em termos de ventilação. Além de dispor de farta oferta de luz natural durante qualquer hora do dia.

Bem estudado, o jogo de cheios e vazios torna muito tênue a divisão entre o que é dentro e o que é fora e, como consequência, a sensação que se tem é de uma casa muito maior do que realmente é. “A separação entre paisagismo e construção se diluiu”, comenta outro autor do projeto, Rodrigo Marcondes Ferraz.

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“Os clientes não faziam questão de piscina. No entanto, durante o desenvolvimento do projeto, nos pareceu que um trecho de água, era algo bastante importante. Pelo frescor, pelo reflexo do sol, pela importância paisagística”, diz Ferraz. Para ele, trata-se de um projeto em que foi possível, na prática, fazer ensaios construtivos, funcionais e formais – uma espécie de laboratório. Mas não sem esforços. 

Acostumado a construir galpões industriais, o fornecedor das paredes de concreto, por exemplo, teve certa dificuldades em entender alguns dos detalhes propostos. “O ideal seria que todos os projetos tivessem esse viés de investigação. Para nós, isso faz parte da responsabilidade da arquitetura”, completa Gimenes.

 

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