Achado crânio de criança com deficiência

Peça de 530 mil anos negaria eliminação de prole com defeito congênito

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Por Alexandre Gonçalves
Atualização:

O crânio de uma criança que viveu há 530 mil anos pode ser a primeira evidência de que os humanos ancestrais não eliminavam sua prole quando ela nascia com defeitos congênitos. O fóssil apresenta traços claros de uma doença rara chamada craniossinostose, causada pelo fechamento prematuro das suturas ósseas que envolvem o cérebro. Além da deformidade, a patologia pode causar danos psicomotores. O achado - batizado de Crânio 14 - ocorreu no norte da Espanha, no sítio arqueológico de Sima de los Huesos, em Atapuerca. A criança pertencia a um grupo de Homo heidelbergensis - antepassados diretos dos neandertais - e tinha entre 5 e 12 anos. Não se sabe se era menino ou menina. "O crânio apresentava depressões muito desenvolvidas, o que oferece indícios de pressão intracraniana elevada", afirma Ana Gracia, do Centro de Evolução Humana e Comportamento da Universidade Complutense de Madri e do Instituto de Saúde Carlos III. Principal autora do artigo publicado hoje na Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), Ana considera possível que a criança tenha sofrido lesões no encéfalo. "E, se sofreu algum tipo de dano cognitivo ou motor, deve ter recebido cuidados especiais (dos outros membros do grupo)", aponta a pesquisadora. Os cientistas opinam que a craniossinostose foi consequência de algum trauma sofrido pelo feto durante o terceiro mês de gestação, embora não se descarte uma causa genética. Nos humanos ancestrais e atuais, a união dos ossos do crânio só ocorre quando o cérebro já alcançou seu tamanho definitivo. Atualmente, a incidência dessa patologia é de até 6 casos para cada 200 mil nascimentos no mundo. PRÓXIMOS PASSOS O sítio arqueológico de Sima de los Huesos foi descoberto em 1976 e contém as ossadas de, no mínimo, 28 indivíduos da espécie H. heidelbergensis, de ambos os sexos e distintas idades. Ana afirma que pretende continuar estudando o Crânio 14 e o sítio em busca de novas patologias que ofereçam pistas sobre o comportamento dos hominídeos antigos.

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